O Filme da Minha Vida (2017)

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*por Murilo Costa, do Central Cine Brasil

Sopro de Fantasia

Está em cartaz nos cinemas desde o dia 3 de agosto a nova empreitada de Selton Mello por trás das câmeras. “O Filme da Minha Vida” é o terceiro longa de Selton como diretor e mostra um cineasta maduro e cheio de referências cinéfilas. Se em “Feliz Natal” o tom era dramático, realista e sóbrio, e “O Palhaço” trazia humor e melancolia em um mundo lúdico, “O Filme da Minha Vida” vai um passo além ao combinar todos esses elementos que permeavam a obra de Selton. Há uma riqueza de sentimentos e personagens, sempre transitando entre aparentes contradições: drama e comédia, ingenuidade e picardia, cenas leves e momentos mais densos.

[Ouça aqui o Central Cine Brasil #67, com um debate sobre O Filme da Minha Vida, e o #68, com uma entrevista com o roteirista Marcelo Vindicatto]

Ambientado numa pequena cidade no Sul do país, “O Filme da Minha Vida” traz como protagonista o garoto Tony (Johnny Massaro), um professor recém-formado que retorna a sua cidade natal para dar aulas de francês em uma escola. Ao chegar, porém, o rapaz se depara com a partida do pai. O francês radicado no Brasil, interpretado por Vincent Cassel, abandona a família e parte sem deixar satisfações. Filmada com elegância rara e precisão estética por Walter Carvalho – o grande nome da cinematografia brasileira há tempos – a região das Serras Gaúchas se vê habilmente transformada em um universo muito particular. O charme da cidade pequena e sua relação com a cidade grande mais próxima – Frontera – são delineados de maneira muito interessante, tanto geograficamente quanto em termos simbólicos. Na cidade grande estão elementos como o Cinema e o Bordel, que figuram no imaginário popular como válvulas de escape para a mesmice e a vida pacata do povoado de interior. A expressão dessas relações está representada também pelo trem – conduzido por Rolando Boldrin, num belíssimo papel-homenagem – que faz mais do que apenas ligar dois pontos no mapa, ou levar e trazer pessoas; escreve histórias, cruza destinos, resolve ou cria conflitos, enfim, conduz a trajetória de vida de seus personagens.

É preciso dizer que muito da ambientação vem da imaginação de Antonio Skármeta, autor da obra original na qual o roteiro do filme se inspirou. O escritor chileno é conhecido por seu estilo sedutor e sua predileção por cidades pequenas e seus personagens pitorescos. Mas é importante ressaltar o mérito de Selton Mello e do roteirista Marcelo Vindicatto – seu parceiro habitual – na transposição desse clima para as telas – e também para o Brasil. São usados recursos suficientes pra dar um toque brasileiro na história, mas não em exagero para tirar a universalidade da narrativa ou das referências. Se por um lado temos a luta de Eder Jofre ecoando nos rádios, nas telas dos cinemas está o implacável John Wayne; numa cena de delírio e sonho envolvendo um potencial triângulo amoroso, podemos pensar em Fellini; já nos tons gerais, há um quê de Nouvelle Vague – o casal interpretado por Johnny Massaro e Bruna Linzmeyer me fez pensar muito nos jovens Jean-Pierre Léaud e Anna Karina em filmes de Truffaut e Godard.

É justamente nesse ponto que o filme divide espectadores e críticos. Por um lado surge a crítica ao tom leve, quase ingênuo, e a estética e personagens que “não tem cara de Brasil”. Compreensível que exista essa visão. Ao colocar “O Filme da Minha Vida” junto a outros filmes nacionais dos últimos anos, é difícil encontrar algo semelhante. É uma obra rara em nossa cinematografia, descolada da maior parte da produção que vemos por aí. Mas isso não é necessariamente ruim. É preciso coragem para se dar ao luxo de fazer cinema-fantasia no Brasil. A realidade urge. Nossos conflitos sociais e políticos parecem demasiadamente escancarados para serem ignorados. Mas é justamente isso que Selton propõe: que o espectador deixe a realidade de lado por ao menos uma hora e meia e, sentado na mágica sala escura, se permita adentrar um mundo novo. Não é justamente essa a função do Cinema?

“O Filme da Minha Vida” é um bem-vindo sopro de brisa fresca para a sisuda produção nacional que se divide entre o “cinema sério” de dramas sociais e as globo-chanchadas de humor e sucesso popular. Há também, em nichos independentes, realizadores intimistas, focados em personagens, mas também são obras de estética realista e dos temas cotidianos. São poucos os filmes que se propõe a algo diferente. E é uma escolha que demanda ousadia. Quando se lida com temas próximos a realidade, há uma certa segurança em buscar a fidelidade ao que se está retratando. São recortes de mundo, que podem ser defendidos como tal. A ambição de narrar uma história com universo próprio e fantasiosa é se expor a uma variedade maior de críticas, que podem ir de pretensioso a ingênuo; exagerado ou pouco imaginativo; muito diferente ou muito clichê.

Nessa mesma leva de cinema fantasioso está também o longa-metragem “Malasartes e o Duelo com a Morte”, que entrou em cartaz nos cinemas na última semana. Mas isso já é tema para a próxima semana.

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