O Santos e as casas

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de Leandro Iamin

O Santos e seus dilemas. O maior time de cidade pequena do planeta é, ou é forçado a ser, um cobaia vivo das experiências do futebol globalizado que mastiga sem pressa o bairrismo que forjou nossa textura esportiva. Em dia de ressaca após o término dos campeonatos estaduais pelo Brasil, a gente male-male tem uma semana para especular o que será de nosso campeonato nacional, e não faltam soldados para metralhar a contenda geograficamente menor. Fica parecendo, numa metáfora rápida, que é, pra variar, o pensamento provinciano atrapalhando os nobres ideais do futebol matemático, aquele que exige que tudo tenha hierarquia, e que cada vez valha mais só o que é de alguma forma maior (onde chegaremos daqui 20 anos com essa loucura pela Libertadores?), e que não faça sentido você comemorar mais o gol do 3×0 que o gol do 1×0, pois, ora, o gol do 1×0 foi mais importante, dane-se que o terceiro foi um golaço – divagações, o Santos não tem nada a ver diretamente com isso.

O Santos incorpora o dilema bairrismo versus globalização de um jeito interessante e falso. Em sua vida, dois palcos: a Vila Belmiro, seu Vaticano particular onde cardeais barrigudos não abrem mão da cadeira cativa, e o Pacaembu, que em dias de Santos Futebol Clube ainda ecoa os aplausos para Pelé e os berros por Giovanni. Ser o maior time de cidade pequena do planeta envolve isso, mesmo, um palco na cidade grande. Subir a serra não é exatamente sair de casa para o Santos, e se um dia a demanda foi aumentada por haver no litoral um time com Pelé, hoje a força que empurra o clube Imigrantes adentro atende pelo nome do novo atleta do século: o número, o fator contábil, e não, não se trata, não aqui, de reclamar dos números – eles podem, assim como o sagrado Pacaembu, ser bem usados.

Numeralha: o placar em 2017 está 29.000 x 8.000. O Pacaembu mobiliza mais que o triplo de torcedores que a Vila Belmiro. 78% do Pacaembu está lotado quando o santos joga, enquanto 49% da Vila é tomado pelos seguidores (cabem mais de duas Vilas no Paca). Comparando Libertadores com Libertadores: dois jogos como mandante, um em cada cancha, 13 mil na Vila, 26 mil no Pacaembu, portanto o dobro de pessoas, mas vá lá, 13 mil na Vila significa 80% de lotação, é bom número. O ingresso médio na Vila era R$29,00 enquanto no Pacaembu (e choveu pra cacete) era R$43,00, de modo que Santos x Stronghest, na Vila, rendeu 380 mil Reais, e Santos x Santa Fe, no Municipal, deu renda de 1 Milhão e 140 mil. É muito mais cifra, além de um considerável engajamento.

Estes números seriam chacoalhados se Santos x Novorizontino fosse no Pacaembu, e não na Vila? 3.195 pessoas foram no estádio da baixada santista, mas quantos iriam ao da capital? Porque sim, o Pacaembu recebe menos “babas” que a Vila, e quem defende a Vila lembra disso, além de considerar os custos com o aluguel de um estádio que não é seu. Vá lá, não estou de lado algum, adoro os dois estádios, estou aqui para pensar um pouco em cima da decisão da diretoria do clube, que parece ter encontrado uma ordem para o dilema: joga 3 vezes na Vila, e uma vez no Pacaembu. Em números, 75% na Vila, 25% no Pacaembu. Quase uma conta inversa à porcentagem de ocupação destes estádios quando o Santos joga. Tendo a achar a divisão justa, desde que a Vila Belmiro esteja sempre lotada, de 12 mil pra cima (cabem 16 mil). E pra Vila lotar, é preciso que o clube não o sabote e o ingresso não seja abusivo – não é o bolso do torcedor que equalizará esta conta.

Caso não lote, que o Santos vá para o 50/50% sem medo, e teste o público da capital também. Planejando, anunciando antes, como agora, como será, ajudando o torcedor a se programar, e, atenção às aspas, “punindo” o palco que tiver adesão abaixo do esperado. Considerando sempre que o Santos é diferente dos outros times do mundo, e jogar no Pacaembu mesmo que o público não compense faz parte da satisfação que a camisa deve à sua própria história, acho uma relação justa. Por conta de eventos musicais, o Palmeiras também vai usar o estádio Municipal no brasileirão. Muito mais legal, convenhamos, usar o velho Paca por motivos de Pelé.

Choveu demais na noite de Santos x Santa Fé, e voltei pra casa de Uber só depois da meia-noite. O trânsito (sim, em São Paulo tem trânsito meia-noite) me permitiu olhar a saída do Pacaembu, e esse retrato impreciso que fiz com os olhos conta uma noite democrática no Municipal. Muita criança com capa de chuva, muito senhor solitário e muita molecada andando para os pontos de ônibus e pequenas ruas do bairro. Isso também conta. Tomara que o clube trate a questão das duas casas com a maturidade e a sensibilidade que a questão merece. Gostei de saber que há um plano de distribuição.

A Vila Belmiro não é a droga que alguns defensores do Pacaembu afirmam, assim como o Pacaembu não é a droga que alguns amantes do Allianz Parque e da Arena Corinthians juram que é. A estes, faço um cafuné solidário, tadinhos. Viva a Vila Belmiro, viva o Pacaembu, e que o Santos saiba explorar o melhor de suas duas casas, dois pontos que explicam a história de um improvável time de bairro que ganhou o mundo, e por que perdê-lo?

 

*Leandro iamin escreve no blog da Central 3 às segundas.

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3 comentários em “O Santos e as casas”

  • Felipe Noronha disse:

    Defendo sempre que o assunto surge (e tem surgido bastante) divisão 50%-50%. Jogos grandes que não clássicos, Pacaembu. Clássicos grandes, Vila, clássicos menores, Pacaembu. Parece confusa essa segunda parte, mas é assim que ambos conseguem lotar. Outro dia sentei pra pesquisar quando tinha começado a ‘briga’ entre estádios e, desde que a subida de serra começou, deu certo para ambos os estádios quando os jogos foram divididos assim. Amo a Vila, é minha casa, moro ao lado do Paca, pode ser minha casa também. Não é difícil querer ter dois lares. É, na real, gostoso demais.

  • Eu sou de um tempo que nos reuníamos em fóruns para falar de futebol – idade tá aí pra isso também. O fórum mais famoso entre santistas era o Fórum da Tribuna – A Tribuna, o jornal.
    Desde aquele tempo, sempre foi óbvio para quem soma 2 e 2 sem paixão e sem pensar na própria comodidade que jogos igualmente divididos eram o ideal. Pela condição sócio econômica, pelos preços, por tantas, tantas, tantas coisas que cansamos de falar.
    Isso era começo dos anos 2000. Desde lá, o clube nunca fez uma pesquisa com os seus torcedores para saber as preferências dele e de quando potencializar a Vila ou o Pacaembu. Ou seja, o Santos não conhece o seu torcedor e decide, quase sempre errado, onde mandar os jogos.
    Ganha menos. Afasta o torcedor. Dificulta a ida dele em todas as situações – exemplo, mandar jogo no Pacaembu num sábado de carnaval, com o litoral cheio.
    Nunca ninguém quis resolver nada disso. Porque dá trabalho pensar.

  • Fernando Cellotto disse:

    Muito bom o seu texto Leandro. Também sou da opinião que deva ocorrer uma divisão de jogos entre os dois estádios. O Pacaembu é o melhor e mais charmoso de todos os que eu conheço.
    O que eu sou contra e da idéia de se construir um novo . Nem na baixada e nem em São Paulo.
    No mais Parabéns pelo central3 que eu descobri faz pouco e já sou fã.

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