Quando Leningrado desafiou o nazismo com o futebol

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Há exatamente 72 anos, em pleno cerco nazista, aconteceu em Leningrado um dos jogos mais impressionantes da história. Um amistoso entre dois clubes da cidade (hoje chamada de São Petersburgo) com o objetivo de devolver a moral a uma população mergulhada em um sofrimento intenso e também de provocar o implacável inimigo nazista, como se fosse um último suspiro de vida.

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É uma bela história que foge um pouco do assunto do momento que é a Copa do Mundo e seus preparativos. Na verdade, um único ponto em comum que liga o dia 31 de maio de 1942 e a iminente competição que acontecerá no Brasil é o futebol. Uma bola, um campo e vinte e dois jogadores. É pouco. No resto, o contexto dos eventos que aconteceram há 72 anos tem mais a ver com uma outra atualidade: O aniversário do dia 6 de junho que acontecerá nas praias da Normandia, nos próximos dias, na presença de grandes chefes de estado.

70 anos atrás, no dia 6 de junho de 1944, acontecia o começo do fim de um pesadelo. Dois anos antes do dia D, a Europa ainda estava no meio do furacão quando ocorreu um jogo quase que irreal e impossível na cidade russa de Leningrado.

Antes de falar dele, vamos lembrar um pouco das aulas de história. No início do ano de 1941, os nazistas lançaram a chamada operação Barbarossa, cujo objetivo era invadir a União Soviética. Se as primeiras vitórias foram rápidas e espetaculares, graças à utilização da Blitzkrieg, o avanço alemão foi interrompido, em setembro daquele ano, nas portas de Leningrado.

Na época a cidade possuía 2,5 milhões de habitantes. Se ela caísse nas mãos inimigas, restaria apenas Moscou para conquistar o país por inteiro. Sendo assim, os russos tinham que resistir, resistir e resistir, a qualquer custo. Os alemães cientes disso iniciaram o cerco da cidade com o intuito de cortar qualquer acesso com o restante do país. O Estado maior alemão acreditava que sem mantimentos, a população local seria obrigada a capitular do que suportar a morte e o sofrimento in extremis. No entanto, os invasores subestimaram a história e o DNA russo e se defrontaram com o interminável cerco de 872 dias (8 de setembro de 1941 até 27 de janeiro 1944) que custou a vida de um número incalculável de vitimas: 1 milhão de mortos pela fome segundo estimativas oficiais, sem contar as vítimas em combate.

O primeiro inverno do cerco foi o mais duro. Como miséria pouca é bobagem, o destino decidiu que as intempéries firmassem um acordo cruel com os nazistas. Algumas noites, o termômetro descia até menos 35 graus célsius. E rapidamente, não havia mais nada o que comer, além de ratos. Uma única via de acesso permitia um escasso abastecimento: um inusitado trenó vinha por um lago gelado trazer algumas migalhas para dois milhões de pessoas! (Meio milhão foram evacuadas no início do cerco). Em janeiro de 1942, 4000 pessoas morriam de fome por dia, sobretudo crianças. Leningrado logo se transformou em um imenso cemitério.

Em abril, os alemães desconfiavam que não havia mais nada e decidiram colocar um fim ao bloqueio. No entanto eles optaram em não invadir pois imaginavam a cidade repleta de doenças infecciosas as quais pudessem contaminar seus soldados. Porém, ainda restava muita gente viva em Leningrado! Debilitados, sem dúvida, mas prontos para lutar até o último homem. Quando os russos tomaram ciência que os alemães acreditavam que todo mundo havia morrido, dois ex-jogadores do Dínamo de Leningrado tiveram uma ideia excêntrica: Desafiar Hitler e os nazistas organizando um jogo de futebol entre dois times da cidade sitiada. Há coisa mais provocativa diante da morte que a prática de uma atividade física?

Antes da guerra começar, o Dínamo de Leningrado era uma das melhores equipes da União Soviética. Quando a temporada de 1941 fora interrompida por causa da operação Barbarossa, o clube era o segundo colocado da primeira divisão do campeonato russo, logo atrás do Dínamo de Moscou. Um outro clube de Leningrado jogava na segundona: O Zenith, mais modesto, era o clube dos operários. A iniciativa dos dois jogadores do Dínamo foi explorada pelas instancias politicas locais, que viam na organização deste jogo uma bela ferramenta de propaganda para devolver a coragem e a moral à população e às tropas.

Para o evento, alguns jogadores da cidade que estavam lutando no fronte tiveram uma autorização especial para voltar à Leningado. Foi sobretudo o caso de alguns jogadores do Dínamo, que era tradicionalmente o time do exercito. Alguns já haviam morrido, outros estavam bem debilitados. Para fazer número e compor o time adversário, foram escolhidos alguns operários da maior metalúrgica da cidade. Este segundo time foi batizado de Nevsky Zavod.

O jogo entre o Dínamo Leningrado X Nevsky Zavod foi programado para o dia 31 de maio de 1942. Ele devia inicialmente ocorrer no estádio do Dínamo, mas os bombardeios foram implacáveis com a cancha. Os corajosos jogadores tiveram que se contentar com campo anexo.

As duas equipes combinaram dois tempos de apenas trinta minutos cada, com o proposito de preservar a integridade física dos atletas já bem debilitados. Apesar destas precauções, vários jogadores desmaiaram em campo sendo resgatados pelos colegas de forma dantesca.

A lenda conta que um jogador do Zenith que estava hospitalizado por causa de uma distrofia, obteve uma permissão especial para jogar e desmoronou em campo depois de ter tentado uma dividida de cabeça com o adversário. No intervalo, nenhum jogador optou em se sentar pois todos estavam cientes de que seria quase que impossível se levantar para a segunda etapa.

O essencial é que este jogo, disputado em um belo dia ensolarado, terminou como previsto e com um placar de 6 a 0 para o time do Dínamo em melhor forma (os jogadores que vieram do fronte tinham ao menos uma ração cotidiana). Este jogo épico fora visto por apenas uma centena de pessoas, dentre eles, vários feridos do hospital situado próximo ao campo, mas o feito dos 22 jogadores foi divulgado amplamente pelos jornais e pela rádio, o que permitiu propalar o mito de um jogo decisivo para retomar a moral da população arrasada. Um segundo jogo foi organizado algum tempo depois, no dia 2 de junho de 1942. Segundo os relatos da época, ele fora disputado em pleno bombardeio aéreo inimigo, porém mais uma vez conseguiu chegar no seu final (placar de 2 a 2).

Duas partidas de futebol, dois tapas na cara no plano maquiavélico de Hitler. A sua importância na grande história é mínima, mas seu simbolismo é enorme.

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Xico Malta participa, na Central 3, dos programas Titulares, Som das Torcidas, Central da Memória e Futebol Urgente.

 

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