#323 – O Bê A Ba do Sertão

Programa recheado com pauta acumulada. Aqui a gente paga o que deve!

Passamos pelos campeões estaduais desde nosso último encontro, pelas expectativas da finalíssima da Copa do Nordeste e pelos jogos de ida da terceira fase da Copa do Brasil. Não esquecemos também da primeira rodada das Séries A e B, com aquele futebol que só não é mais safado que a SAF do Mecão. Vem com a gente se atualizar e ficar puto.


Nossa playlist oficial da sétima temporada: https://spotify.link/mqrZltTJ6yb

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A herança maldita de Gaetano D’Agostino

“Eu juro que se não respeitar este sermão, serei morto da maneira mais brutal”.

Este juramento, pronunciado durante o rito de iniciação à ‘Ndrangheta, a máfia calabresa, atormentou Gaetano D’ Agostino ao longo de sua carreira. Contudo, o ex-jogador da Fiorentina e Udinese nunca fez esta jura à mais influente organização mafiosa dos anos 90. Grande promessa do Calcio em sua juventude, Gaetano teve que carregar por muitos anos o fardo de seu pai, Giuseppe D’Agostino, ex capo da ‘Ndrangheta na pequena cidade de Laureana di Borello. Preso em 2006, o seu pai colaborou com a justiça denunciando vários colegas do crime organizado. E na Calábria romper com o código da Omertá significa assinar uma sentença de morte por toda a vida.

O ingresso na máfia calabresa se dá somente por elo de sangue. O dia em que Giuseppe D’ Agostino decidiu, através de uma picada ritual no dedo, se engajar nas leis da ‘Ndrangheta, ele se transformou em um mais novo membro da poderosa máfia que suplantou a Cosa Nostra siciliana. Nos anos 80, o pai de Gaetano foi promovido. Apoiado por ‘Ndrina Belloco de Rosano (cada ‘ndrina, composta por membros de uma mesma família, controla o seu próprio território), Guiseppe D’Agostino era, em 1996, um dos trinta mafiosi mais procurado da Itália. Encontrou asilo em uma pequena casa em Rosano, província de Reggio Calabria, longe de seu filho Gaetano, nascido em 1982, em Palermo. Neste mesmo ano, Gaetano marcou mais de 100 gols no equipe de juniores do clube da capital siciliana.

Em 1998, Gaetano foi contratado pela Roma. Uma transferência forçada pelo pai do jogador, que considerava a capital mais segura que a Sicília. Ao lado de Francesco Totti, D’Agostino venceu o Scudetto na temporada 2000-1, entrando apenas vez em campo. Para o siciliano, a adaptação à città eterna foi difícil. Entre 2000 e 2005, o jogador, ainda no clube romano, foi emprestado ao Bari. Em seguida ele assinou um novo contrato com o Messina e retornou à sua terra natal. Na temporada seguinte, Gaetano jogou ao lado de Giuseppe Sculli, neto de Giuseppe Morabito, também capo de um clã da máfia calabresa. O avô mafioso foi preso depois de anos foragido, quando assistia a um jogo de seu neto no estádio. Foi o início dos problemas de Gaetano. Em 2006, seu pai foi preso por ter participado de mais de dez homicídios. A partir dai, o senhor Giuseppe D’ Agostino optou por colaborar com a justiça italiana, traindo o código de honra mais importante da ‘Ndrangheta: a Omertá!

A máfia que não perdoa a traição, condena os desleais e toda a sua família à pena de morte. Gaetano D’Agostino corria sério perigo e pagará para sempre pela felonia de seu pai.

O time do Messina sabia muito bem que Gaetano estava em perigo. A cada treino, o jogador era protegido por policiais. Depois de uma boa campanha na Sicília (4 gols em 27 jogos), a Udinese e seu presidente Giampaolo Pozzo, ávido por bons negócios, contratou o jogador. Ele ficaria quatro anos no norte da Itália. Durante a sua terceira temporada, Gaetano formou com Simone Pepe e Antonio Di Natale um dos trio mais temidos da velha bota. O clube de Friuli chegou até as quartas de final na Copa da UEFA, eliminado pelo Werder Bremen. Na ocasião, Gaetano chamou a atenção de grandes clubes da Europa. Juventus, Real Madrid e Villareal se interessaram pelo palermitani. Graças ao sucesso alcançado, Gaetano fora convocado por duas vezes pela Azurra de Marcello Lippi. Entretanto, os clubes abdicaram do jogador cientes da dificuldade em protege-lo de um ataque iminente da máfia. Na época, D’Agostino contou o episódio de sua possível transferência ao Real Madrid ao site da revista Panorama: “Estava quase contratado. Iria assinar um contrato de 5 anos por 2 milhões de euros anuais. Faltava apenas viajar até Madrid para assinar o contrato, porém a Udinese não concluiu o negócio. Eles queriam mais contrapartidas e o negócio acabou não vingando e Xabi Alonso acabou sendo contrato no meu lugar”.

Neste mesmo ano, a Juventus também preferiu contratar Felipe Melo ao invés de Gaetano. Em 2010, a Fiorentina assinou com Gaetano por 10 milhões de euros.

Depois de uma temporada ruim no clube viola, o jogador teve passagens pífias pelo Siena e Pescara. Na temporada passada, aos 32 anos, Gaetano atuou no fraco Benevento – time de uma pequena cidade próxima à Nápoles – pela Serie C1. Quase no termino de sua carreira desperdiçada, Gaetano ainda vive sob a pressão da máfia e a dura herança de um pai que estigmatizou seu filho e sua família. A família segunda a qual o escritor calabrês Corrado Alvaro dizia que é a força da Calábria, sua coluna vertebral, sua genialidade, seu drama e sua poesia. Gaetano D’ Agostino sabe bem disso.

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Outros derbies “intramuros” da Itália

No continente europeu, a Itália é o local com mais rivalidades de times de uma mesma cidade. Atualmente há cinco derbies intramuros na Serie A. Os clássicos de Turim, Genova, Milão, Roma e Verona. No entanto já existiram outros ao longo da história do calcio. Alguns com certa importância e outros para dar inveja aos nossos cartolas e empresários do futebol brasileiro.

Importante ressaltar que até o ano passado o futebol italiano estava estruturado da seguinte forma: Serie A, Serie B, Serie C1, Serie C2 e Serie D. As series C1 e C2 (eram a primeira e segunda divisão da Lega Pro desde 2008) se juntaram, ficando somente uma terceira e única divisão profissional chamada simplesmente de Lega Pro.

 

Nápoles

É a terceira maior cidade da península e não possui nenhum derby local. Em contrapartida, os clubes profissionais e semiprofissionais da periferia estão na Serie B e Lega Pro. Precisamos voltar um século para ver duas equipes da capital do sul se enfrentarem. O Napoli e a Internazionale Napoli, a segunda sendo o fruto de uma cisão da primeira …. dez anos depois de se uniram para dar vida ao que conhecemos hoje, o grande SSC Napoli. Estas duas equipes tiveram a oportunidade de se enfrentarem nas fases preliminares do campeonato italiano. O balanço é bem igualitário, cinco vitórias pra cada lado e dois empates.

 

Catania

Conhecemos bem o Catania. Time que permaneceu dez longos anos na Serie A, antes de cair para a B na temporada passada. Mas também existe na bela cidade siciliana o Atlético Catania que foi o principal time da cidade, depois da falência temporária do rival no ano de 1993. Os dois clubes possuem quase as mesmas cores. O vermelho em comum, azul claro pra um e escuro para o outro. Pequenas nuances. Os dois se enfrentaram uma dezena de vezes na Serie C1. Depois de uma falência em 2002, o Atlético é hoje um time amador.

Vale ressaltar que o Atletico Catania foi fundado em 1986 e refundado em 2005 por conta da decretação de sua falência.

 

Bergamo

Fundando ao mesmo tempo que a Atalanta, o Virescit Boccaleone (um bairro da cidade lombarda) desapareceu e reapareceu ao longo dos anos e acabou somente se afiliando à federação em 1970. 14 anos mais tarde e depois de uma ascensão progressiva, o desconhecido time de Bergamo alcançou a Serie C2, depois a C1 e quase alcançou a Serie B se não fosse a derrota para o Reggina em 1988! No entanto, o derby aconteceu um ano mais cedo, pela Copa da Itália com a vitória de 2 a 1 para os famosos Nerazzurri. O Virescit fusionou em seguida com o Alzano e reencontrou a Atalanta na Serie B na temporada 1999/00. Atualmente o clube está sediado em Alzano Lombardo, cidade próxima de Bergamo, porém em outra comuna.

 

Vicenza

No ano passada a bela cidade de Vicenza podia se orgulhar de ser a sexta cidade italiana a ter dois clubes profissionais. O Vicenza é bem conhecido, vice-campeão italiano em 1978 e semifinalista da Copa das Copas vinte anos mais tarde após ter conquistado a Copa nacional. O outro time da cidade veneta se chama Real Vicenza. Mesma cores, mesmo estádio e uma ascensão fulminante até chegar no profissional. Com o desaparecimento da C2, o time caiu automaticamente para o terceiro nível do calcio onde também se juntou a ele o rival Vicenza, um ano depois. Porém não teve derby, já que este último passou pela repescagem para a Serie B onde ambos poderão se encontrar pela primeira vez já, que o Real tem chances de promoção.

 

Florença

Como em Nápoles, várias equipes florentinas se enfrentaram nos primórdios do calcio. Porém os jogos aconteceram em campeonatos regionais, nunca no nível nacional. Aos poucos, todos estes pequenos clubes foram desaparecendo e se fundiram para a criação da Fiorentina em 1926. 20 anos depois, nascia a AS Rondinella. Com camisas listradas de vermelho e branco, ela alcançou o profissionalismo em 1979 chegando até a Serie C1, lá permaneceu de 1982 até 1987. Infelizmente, nunca se enfrentaram a não ser em amistosos. Por pouco, pois a Rondinella deixou a C2 em 2002 quando chegou a Fiorentina logo após a sua falência. Vale lembrar que a Rondinella foi o clube formador do campeão mundial Barzagli.

 

Vercelli

Na cidade piemontesa de Vercelli, existiu um time que teve a audácia de colocar em perigo a supremacia do lendário Pro e seus sete títulos de campeonato italiano! Em 2006, em Belvedere, bairro de Vercelli, nascia o Pro Belvedere Vercelli graças a fusão com um time da cidade de Trino Vercellese. O início fora discreto na Serie D. Um estágio acima se encontrava o Pro Vercelli. O Belvedere precisou de três temporadas para alcançar o tradicional time da cidade e deste modo inaugurou o primeiro derby da história. No fim da temporada, o Belvedere caiu mas conseguiu permanecer no tapetão graças a quatro falências, dentre elas a do Pro Vercelli. Com isso, ambas as equipes se encontram e dois anos mais tarde, o Pro voltava a Serie B depois de longos 64 anos.

 

Rimini

O AC Rimini faliu e foi rebaixado para a Serie D em 2010, três anos depois de ter disputado a Serie B, terminando na quinta posição. Ele reencontrou o time de Riccione, outra cidade balnearia da costa Adriática. Por motivos obscuros, este último mudou de nome e de cidade, transformando-se em Real Rimini. O verdadeiro Rimini venceu duas vezes o “rival” e rapidamente alcançou a Lega Pro. O Real chegou na oitava posição, mas pagou caro pela sua arrogância no ano seguinte. Acabou em decimo oitavo lugar com 5 empates, 29 derrotas e zero vitórias. 16 gols marcados e 107 tomados. Um ano depois o time desapareceu.

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