Ei, Capez

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Amigos leitores, peço de antemão desculpas pelo domínio que a emoção terá sobre a razão neste texto. Eu sei que normalmente desejamos ler argumentações racionais e bem embasadas, daquelas que nos esclareçam as coisas e nos ajudem a formar uma opinião própria. É o que eu planejava produzir quando me sentei e abri o temido “Documento1” do Word, mas uma rápida passada de olho pelo noticiário me tirou qualquer estabilidade que ainda se tenha nos dias de hoje. A responsável da vez foi a seguinte manchete do Estadão: Paulistão 2016 terá novas medidas contra a violência”.

O conteúdo não é novo, apenas a reafirmação da política de pasteurização dos estádios brasileiros, mas as medidas são inéditas. A principal é o empoderamento de cada indivíduo presente na arquibancada para exigir que o lugar marcado em seu ingresso esteja disponível para ele. Caso não seja respeitado, multas serão distribuídas aos torcedores que ocupam a cadeira da discórdia e ao clube mandante. O motivo do meu emputecimento é a justificativa que dão para tal medida, presente no título da matéria inclusive: a segurança.

Não entendo como garantir o lugar marcado possa aumentar a segurança num estádio de futebol. Em primeiro lugar, brigas na arquibancada são raras e o seu motivo normalmente é a tensão que um jogo de futebol traz travestida de qualquer desculpa que se encontre na hora: um pisa no pé do outro, um torcedor se incomoda porque o companheiro critica o time em voz alta durante o jogo ou simplesmente porque sim. Mais ou menos como em determinadas casas noturnas, mas em um grau menor. Depois porque essas brigas normalmente não levam a lugar nenhum: acontecem uns empurrões, todo mundo em volta grita e eventualmente cada um vai pro seu lado, sem nenhum arranhão sequer.

Também me irrita profundamente essa repetição enojante de que estádio é perigoso, de que o problema do futebol é a violência etc: NÃO É! Eu vou ao jogo quase toda semana e não me sinto ameaçado nem presencio cenas de violência (pelo menos não mais do que presencio rotineiramente na rua). Estádio é um local caótico e tenso, porque o que acontece ali é vital para a vida dos que lá comparecem e ninguém fica relaxado e ordenado numa situação dessas, mas não é um ambiente violento. Entendo que quem foi criado no shopping center e protegido de emoções humanas a vida inteira confunda tensão com violência, mas a patologia de alguns não pode ser imposta à toda sociedade apenas para que esses possam ir ao jogo sem lidar com sua visão superprotegida do mundo.

Eu fico puto porque cada vez mais a segurança é deliberadamente usada como desculpinha pra mudar o padrão de comportamento dos torcedores, impor um novo estilo de “torcer” e expulsar aqueles que frequentam os estádios há décadas. Esse movimento não acontece de maneira espontânea, com os novos torcedores entrando, entendendo o que se passa ali e aos poucos mudando a maneira como as coisas se dão através de sua presença e atitude durante os 90 minutos: é uma mudança imposta de fora para dentro, através de leis, alvarás, multas e o cacete a quatro.

Acho inconcebível que o poder público se preste a esse papel, decida adotar um lado e defendê-lo com um discursinho de que pensa no bem coletivo de alguns contra o mal coletivo de muitos outros, ora! Mais uma vez é o público sendo apropriado pelo privado. E a “segurança” lá, como legitimadora de tudo isso. Legitimadora e agente inviabilizador de diálogo, já que se opor a tais medidas se transforma em defender a selvageria nos estádios. A menção à Batalha do Pacaembu, em 1995, não aparece lá por acaso, mas curiosamente não se discute porque depois de 20 anos da política atual continuamos falando tanto em segurança. Se as medidas fossem eficazes seriam necessárias cada vez mais e mais?

Tenho o ímpeto de invadir a Assembleia para me fazer ouvido por esse tal de Capez quando ele diz que “temos que aproximar o futebol brasileiro do europeu e norte-americano” não só porque isso mostra que ele não entende nada de futebol, mas também porque na festa da arquibancada, na liberdade, no preço dos ingressos e em tudo que os europeus (comparar com os norte-americanos é piada, apesar de terem coisas interessantes ainda estão engatinhando no futebol) tem de bom ele não faz nada para nos aproximar. Muito pelo contrário, continua defendendo a proibição a bandeiras, fogos e tudo o mais que dá sabor ao caldo futebolístico.

Acho doentio que se faça leis baseando-se apenas em um único critério sem ponderar pelos custos que essas leis trazem (o ordenamento, esterilização e artificialização de uma arquibancada que era caótica, tensa, emocionante e saborosa é sim um custo social importantíssimo – pelo menos para quem frequenta estádios há algum tempo). Tudo isso sendo feito de maneira tão deliberada e hipócrita torna o fato ainda mais enervante.

Sinto que se o futebol não tivesse me tornado uma pessoa tão civilizada e se eu não tivesse você, leitor, para me ouvir, provavelmente as medidas pela segurança no futebol me fariam atentar à segurança do senhor Capez e sua corja. Muito obrigado pela leitura e paciência.

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