A festa da morte

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A coisa mais linda é quando o demônio sai de sua alma. Tudo muda, os olhares transmitem esperança, não mais confusão. Aquela nebulosidade dá lugar à beleza. Demônios diários, que matam de depressão por aí, como o trânsito, a poluição, a injustiça, a loucura social, ficam pequenos perante a infindável liberdade nas coisas naturais deste planeta Terra. Sem o demônio, você não se apequena diante do veneno e recria antídoto – consciência cristalina, fluente como água. E a batalha na mente não cessa, mais do que diária, ela é “minutária”. Esta é sua merda de cidade, de fumaça, de metrô desumano, lento, caro, fétido. Assim como outras tantas mundo afora, esta não é uma cidade feita para humanos. “É assim ou mude pra uma caverna!”. Esta cidade mata as coisas naturais e cortam sua, até então, contínua produção de boas energias.

Matou, inclusive, seus clubes de futebol, está neste momento em que vivemos concluindo sua chacina ao acarpetar de oco plástico os últimos campos magnéticos de amor que sobraram. Após a intifada das décadas iniciais, quando exterminaram centenas de clubes paulistanos, os sobreviventes se tornaram zumbis, andróides de si mesmos e suas tradições honrosas. Metade real, metade virtual – e podem ter certeza de que já passou da hora de cada um escolher qual lado prefere. Isso é global, o futebol moderno chegou e arrebentou com tudo. Aqui, tudo é nu e cru. Dos times “sobreviventes”, nenhum passou ileso ao veneno do mundo moderno e sucumbiram. E tudo decai, a linguagem, o contato humano, os sorrisos honestos, os abraços espontâneos. E vêm as viroses de individualismo, consumismo e esta tal exibição material, absurdamente desumana como vemos hoje.

Exibir, fotografar, fazer pose o tempo todo, filmar, escrever no ‘face’, poucas palavras obrigatórias (até há um sítio eletrônico que limita as palavras, e “é sucessão”!), viver como seres programados (era robô o nome, certo?). Exibir, fotografar. Exibir matéria o tempo todo, pois toda audiência consumista e seletiva, classista, individualista tende a ser mera matéria no cenário, como vemos hoje no futebol, concertos e etc, etc, etc. Rótulos das cervejas e ‘drinks’ exibidos como num comercial. Ser matéria. Dias estranhos nos encontraram. O oposto da união é a desunião. Imagine vários pontos desenhados, separados entre si, esparramados dentro de um quadrado. Agora, imagine estes mesmos pontos agrupados, como numa roda de reza, por exemplo. Ao lado da união, como sua fiel companheira, mora a comunhão. Quando não apenas dividem espaço, como principalmente emoção, razão, amor – o grito de gol no Morumbi com 120 mil pessoas, em 1986. Na oposta extremidade da questão, senta junto na nebulosidade da desunião esta tal de ostentação. Quem não pode dividir, compete. Exibe, fotografa, “curti”, entra na onda demoníaca. O “super ultra mega legal show do Paul McCartney na abertura da Arena do Verdão”, o inferno abrindo sua bocarra, com fome. “Bem vindas, minhas novas almas”, gritará o espírito intruso que agora manda e comanda.

Ostentar, ao contrário da beleza da comunhão, é a lei agora. Eu compreendo que há motivos para andar por aí como um poste telefônico. Mas a doença social é a doença dos pontos separados, ostentando algo que não é de mais ninguém, senão daquele que o possui. O celular é o totem do separatismo humano, e foi vendido como ideia do contrário. Queremos realidade. Quero ouvir sua voz, ver seus gestos que acompanham sua fala, coisas que nem mesmo a tal da ‘webcam’ pode transmitir como elas são. Há tempos te vejo como um holograma terrível, sempre igual e chato. Talvez minha crítica também carregue estas características, numa obrigatória simetria do yin com o yang. O meu totem pode ser a chatice, sem problemas para mim. Perto do seu totem, fico limpinho com minha insuportável chatice.

Não compito com isso, não. Sei que, independente de quem chegar primeiro ou como, todos estacionaremos no mesmo local, no fim desta nossa mesma estrada. Mas o seu totem é a vitoria da ostentação, 24 horas por dia, em todo o globo, o Império que superou nosso espaço-tempo, nos domou como feras. Do grande milionário aos famintos das cidades modernas, todos carregam o troféu de sua própria falência, da posse, do aparelhamento das pessoas que, de fato, são carnudas e ossudas. E junto do aparelhamento, em inversa proporção, somem o amor, a educação, a comunhão. As pessoas não mais convivem os dias juntas, ainda que respirem o mesmo fétido ar do mesmo vagão, dia após dia.

A atitude entre nós, hoje, é pura agressão, competição (mesmo que velada com o sabor enganoso de um falso auxílio), um matando o outro, desde o debutante olhar (sempre odioso, por quê?) até a faca que rasga e sangra. Para o deleite dos “reis” do mundo, lá em cima, rindo com seus dentes de ouro à mostra dos idiotas aqui embaixo, na sopa da confusão que nossos corpos embriagados compõem. Na confusão de mostrar todos participam e quem vai “perder tempo” olhando, percebendo, se revoltando e, logo, agindo? Sobraram os ativos na confusão, secaram os passivos na guerra, na cura, não há sequer tempo para pensar em pensar. Bem vindos a mundo das fast-emotions. Ostentam suas fotos ou algum comentário “revolucionário” e com 88 “curtidas” dos amigos se sentem satisfeitos, agraciados, suas reclamações são ouvidas, seus desejos saciados… A vida, hoje, vale 88 curtidas no ‘face’, ou é exagero meu? Mas vocês já sabem que eu amo-lhes sem medidas. Sei que ostentam pelas cidades este cenário apocalíptico em puro desespero, como que gritando “socorro, alguém me tire deste maldito trêm sujo, fedido, caro, injusto, idiota, desta vida incauta a verdadeira evolução do homem, salve-me de meu bairro de merda, minha rua esquecida, minha casa turbulenta aos gritos do mister Bonner, Casoy ou Datena, do enterro do rock, da poesia, do humor que não era ‘fast’, da ostentação das opiniões, da política popstar, do esquecimento do amor”.

Este é o pensamento, o sentimento. Mas ele dura frações de um segundo, não gera ações. A ação é pedir desculpas para a senhora que você pisoteou naquele vagão sujo, lotado, fétido… Mesmo que, em seguida, siga apertando os botões do aparelhinho mágico. Não é ter, é ser questão. Este “ser” invoca outra questão, de quanto se reserva de tempo de cada um dos dias para as verdadeiras questões a nossa volta. A luta. À noite (ou à tarde, de manha, tanto faz…), teremos outra festa da morte para suar, sangrar e chorar. Sim, nas festas da morte vigentes depositam nossos revolucionários fluidos, não mais nas lutas. Festas dos zumbis, “dead walk yeah”, vampiros atraentes às jovens que orgulhosamente leiloam sua virgindade, ‘Halloween’, celebração da autodestruição, barulho em lugar de música, estática e não movimento, maquiagens para fora e pouca idéia para dentro, olhares desconfiados e contentes, medo de chuva, medo de se sujar, medo, medo, medo da vida, sempre dopados, muito dopados (se me permitem o eufemismo), ostentação segue a pleno vapor nas festas, também, claro. Desde gestos, gostos culturais pasteurizados, fast-opiniões adquiridas nas fast-televisões do metro, de suas palmas de mãos, nas salas de espera dos hospitais… E os aparelhos não ganham sossego nas tais festas, não se sabe quem está dançando, quem está filmando, quem não estaria, quem está ostentando, quem vai chorar, quem vai sorrir.

Nostradamus, seu puto, meus cumprimentos! Poucos retos sobraram, a resistência morre de fome e sede, mirando a paralisia social. Não há mais o “alternativo”. Faz parte do processo maluco no qual estão atolados (lento e confuso, pois). Qualquer “alternativo” que se apresenta é instantânea e totalmente cooptado pela vida comandada por botões e os senhores dos botões. E tudo vira rótulo. O mundo se descobre, enxerga suas brutais diferenças, encontra nestes aparelhos a idéia da igualdade. Mas ela, hoje, vive na idéia, na embalagem, do lado de fora, no querer, na esperança de que um dia ela ganhará corpo, viverá como um corpo, viverá… Estamos, talvez, semeando a igualdade que se viverá. Apenas talvez, porque a vida ainda não nasceu. Por enquanto, vivemos a confusão do lado interior do útero. Ela talvez nunca se cure. Poderá, mas custará escolher estes pequenos sacrifícios. O portão é reto, profundo e amplo. Festas de zumbis, não mais! A vida reta quer mais. A vida quer pontos vivos, sem demônios. A vida quer…

Ps: não vou trilhar a necrofilia, escrevendo sobre a “Arena Grêmio” vazia e fria no famoso derby local, o nível técnico grotesco dos jogos, o estrelismo glorificado, os preços caros… Há muito que se expurgar do futebol de hoje em dia, sim. Mas não o farei, porque o que tenho visto deste jogo é aterrador, não carece mais palavras. Deixa-me claro que não é mais aquele jogo, é outro qualquer. Bom dia.

 

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