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Razão, argumento e (pouca) esperança

Por Luiz Felipe de Carvalho

Jair Bolsonaro teve mais de 49 milhões de votos no primeiro turno da eleição de 2018. Um estudo do MCSBS (Meu Chute Sem Base Científica) mostra que cerca de 10% deste montante realmente esperou a vida inteira para ter um candidato que refletisse suas visões de mundo, baseada em coisas como autoritarismo, a ideia de que bandido bom é bandido morto, viés machista, desvalorização da causa negra, repúdio aos homossexuais, apelo ao armamento da população, à força como um valor maior que o conhecimento, repulsa aos direitos humanos, glorificação da tortura, entre outras coisas. Se você é uma dessas pessoas, não é nem questão de querência minha, nem desrespeito, mas acho mesmo que esse texto, ainda mais a esta altura do campeonato, não vai te servir de nada.

Pronto, perdi 4,9 milhões de leitores. E vou tentar escrever esse texto com a maior empatia do mundo, porque sim, há pessoas que respeito e amo que são eleitoras de Bolsonaro, ou que simplesmente pretendem se omitir nessa reta final de definição do que será o Brasil pelos próximos quatro anos (ou mais). Você deve ter notado que seu amigo/parente simpatizante da esquerda está especialmente chato esse ano, não é? Existe um motivo pra isso. É a primeira vez desde a redemocratização que do outro lado há uma candidatura abertamente antidemocrática. Não vou ficar entremeando esse texto com vídeos, então depois de uma pesquisa extensa entre as barbaridades que já disse o candidato (quase todo dia a lista aumenta!), selecionei uma que acho que simboliza bem o que ele pensa:

(Caso por algum motivo você não tenha conseguido ver o vídeo nesse momento, te explico. Trata-se de um comício do candidato realizado no início do ano passado. Ele começa falando que o Estado não deve ser laico, e sim cristão, mas a parte mais importante está no final. Transcrevo: “Vamos fazer o Brasil para as maiorias. As minorias tem que se curvar às maiorias. As leis devem existir pra defender as maiorias. As minorias se adequam ou simplesmente desaparecem”).

Que um candidato à presidência do Brasil diga tal atrocidade no ano da graça de 2018 já é um absurdo. Que ele seja o favorito à vitória, bem, isso entra na prateleira do surreal. Mas escolhi justamente esse trecho porque expressa com imenso poder de síntese todo o “ideário” do ex-deputado: truculência e ódio às minorias (caso se interesse por mais, prepare o estômago e escreva “bolsonaro em cinco minutos” no Youtube).

Acho que você atingiu agora um ponto sem volta. Caso tenha chegado até aqui, não dá mais pra dizer “eu não sabia que ele era assim”, ou “no meu grupo do whats não tinha aparecido esse vídeo”. Em minha intensa ingenuidade, penso que ficarei a partir de agora com quase nenhum leitor, porque mesmo que do outro lado fosse, sei lá, o Collor, seria impossível votar em alguém que diz tais coisas. Mas minha racionalidade é maior que minha ingenuidade, portanto prosseguirei.

Muitos bolsonaristas moderados acham que ele está sempre brincando, não falando sério. Admitem não concordar com o que ele prega, mas acham que é tudo fanfarronice. Há pouco tempo o filósofo, professor e escritor americano Jason Stanley, autor de um livro sobre o fascimo moderno, deu entrevista à Folha de São Paulo, e na pergunta final questionou a repórter Danielle Brant e, ao mesmo, tempo todos nós: “Você quer eleger alguém que é tão abertamente antidemocrático? Que está prometendo violar as regras? Eu não entendo. Por que vocês não estão acreditando nele?”. E é isso. Que malabarismo intelectual é esse que faz as pessoas crerem que ele não fará as coisas que abertamente admite que fará? (vale a pena ler a entrevista completa, aqui)

Este texto não está sendo escrito com raiva. Já faz muitos dias que o primeiro turno se encerrou. Estou tentando ser o mais sereno e mais transparente possível, e ter um “diálogo” com o leitor. As aspas estão aí porque é impossível um diálogo de fato, já que a escrita está acontecendo de forma unilateral. Mas tento “ouvir” as vozes contraditórias. Vou tentar argumentar com algumas delas:

Voz 1: Não queria votar em nenhum, mas vou de Bolsonaro porque ao menos ele é diferente do que está aí

Eu: Mas o Bolsonaro é deputado há 28 anos! Um carreira inteira na política. Ele não é de fora, ele não representa o “novo”. O fato de sua carreira política ser medíocre não o transforma automaticamente em sinônimo de renovação. Aliás, boa parte da família também está na política. Nada ilegal, direito deles, mas não venham me dizer que são a “mudança”. Se era pra votar em alguém de fora do sistema político, havia opções mais coerentes, como João Amoêdo, à direita, e Guilherme Boulos, à esquerda.

Voz 2: Ele vai acabar com a violência

Eu: Bolsonaro já disse com todas as letras que violência se combate com violência. Que pretende dar armas de fogo pra população em geral. Que acha que nossa polícia mata pouco. Se você honestamente acha que essas ideias vão acabar com a violência no Brasil, eu sugiro humildemente que pense de novo. E então de novo. Pense com detalhes. Pense em armas, muitas armas, disponíveis pra todos. Pense em um líder que sugere mais violência. Pense.

Voz 3: Ele vai acabar com a corrupção

Eu: Gostaria muito de entender de onde veio a ideia de que Bolsonaro é a panaceia para a corrupção brasileira. Mesmo que ele fosse um homem absolutamente íntegro (há indícios e até algumas provas de que não seja), corrupção não se combate simplesmente sendo honesto. É preciso criar mecanismos de controle, e nisso o programa de governo do candidato é vago e apenas repete palavras de ordem sem nada concreto em termos de proposta. Isso não resolve corrupção nem dentro de casa.

Voz 5: Ele é cristão

Eu: Ao ser perguntado se achava que Dilma terminaria o mandato, Bolsonaro respondeu “eu espero que acabe hoje, infartada ou com câncer”. (link aqui https://www.youtube.com/watch?v=hbIlTr33WN4). Se isso pra você é ser cristão, você sabe menos de Cristo do que eu, um agnóstico teísta.

Voz 6: Até parece que eu vou deixar o PT ganhar de novo!

Eu: Evitei esse assunto até aqui, porque honestamente acho que essa disputa é apartidária. Fosse quem fosse no segundo turno contra Bolsonaro, seria a democracia em disputa. Mas sei que o ódio ao PT é um tipo de patologia com camadas complexas, que deverá ser estudada a fundo por sociólogos e historiadores. Mas apelo novamente à razão. Sei que é difícil racionalizar o ódio, e sei que você odeia o PT há algum tempo, mas já pensou profundamente no porquê? Eu digo, você pode odiar nosso sistema político como um todo, esse toma lá dá cá tão institucionalizado desde tempos imemoriais, mas porque o ódio ao PT especificamente? Te dou um tempinho pra pensar, ninguém está vendo. (Se estivéssemos vivendo uma ditadura eu colocaria aqui uma receita de bolo enquanto você pensa). Há razão para odiar mais o PT do que, sei lá, o PP? PSDB? PRTB? PSL? Mesmo que sua conclusão final e racional seja que sim, é prudente que esse antipetismo seja maior do que o antifascismo?

O discurso bolsonarista é perigoso. Você certamente tem visto a quantidade de agressões ocorrendo país afora contra pessoas que se manifestam contrariamente ao capitão. Até uma morte já ocorreu na Bahia. De certa maneira, Bolsonaro endossa essas agressões e as legitima. Exemplo prático: dia desses no meu trabalho um senhor foi atendido por uma colega. Como eu e ele temos uma relação amistosa, dentro dos limites do trabalho, ele veio até mim após o atendimento e disse “Bolsonaro tem razão”, apontando para ela. Depois se retirou, e eu fiquei sem entender nada. Só depois descobri que ele tinha ficado irritado com algo no atendimento, e que suas palavras meio que diziam “mulher tem que ganhar menos mesmo”, ou “mulher é inferior mesmo”. Perceba que só o fato de Bolsonaro ter ganhado o primeiro turno com alguma vantagem já deixou esse senhor se sentindo livre para desferir tal barbaridade sem sequer corar de vergonha. Bolsonaro meio que normaliza o absurdo.

Perceba, ele não vai colocar perseguição a minorias, ou a mulheres, em seu programa de governo. Ele não vai pessoalmente sair às ruas de Brasília com seu fuzil matando travestis. O que ele vai fazer, caso se eleja, é tornar essas coisas normais. Sua mera popularidade já causa esse efeito. Eu mesmo, ainda que escrevendo um texto argumentativo e sem agressões, coloco um alvo nas minhas costas – alvo este que estaria aqui de toda forma, desde que ouvimos sobre o “extermínio dos vermelhos”. Eu, que há pouco escrevi nessa Central 3 um conto de ficção científica sobre um futuro distópico, imagino um futuro triste, em que milícias não-oficiais caminham por nossas ruas procurando “transgressores” em nome de seu comandante. Seria um tipo de ditadura diferente, em que a violência contra a sociedade civil viria da própria sociedade civil. E vejo Bolsonaro lavando as mãos. Com sangue. Simbolismos à parte, não vejo esse futuro tão distante assim, caso ele vença. E gostaria imensamente de estar errado.

Tudo isso que está acima não foi escrito sem pensar. Há muita racionalização envolvida. Se o texto não atingiu seu intento, que era o de te fazer ao menos pensar em seu voto, é por pura incompetência estilística e argumentativa do escritor. Não o culpem. Ao menos ele poderá dizer que tentou.

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Zé no Rádio #72

José Trajano está no ar, e fala hoje da rodada do final de semana no brasileiro, que reafirmou a liderança do Palmeiras, colocou de vez São Paulo e Grêmio longe da briga e mostrou um Flamengo forte. Copa do Brasil, que acabou, e Libertadores, que vai pegar fogo, também foram temas do programa que contou também com Leandro Iamin, Matias Pinto e Paulo jr.

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Vaidapé #66 Existe rap de direita?

Vaidapé #66 Existe rap de direita?

Papo com Souto MC

O Vaidapé na Rua tenta mas não consegue escapar do tema eleições. Mas, para voltar às origens vamos falar um pouco de cultura, mais especificamente Hip-Hop. Mano Ozie recebeu Souto MC, uma das principais rappers da nova geração do rap paulistano para responder a pergunta: Existe rap de direita?

Antes de ir a fundo no tema, foi apresentado o contexto do surgimento do Hip-Hop e a origem do termo “direita” como definição de espectro político. Além de mc, Souto é historiadora e trouxe um panorama sobre o cenário político e social que moldou o início do Hip-Hop no começo dos anos 1970.

Mano Próximo contribuiu com o debate através de sua coluna histórica. Ele fez algumas considerações sobre as narrativas que polarizaram o Brasil sobre os governos petistas. Com todo mundo na mesma página e entendo o que é a direita e o que é o Hip-Hop o papo rolou solto.

Para encerrar, Dj Pae Vito fez uma homenagem à Chiquinha Gonzaga em sua coluna musical.

Escute o programa na íntegra e assine o feed do #VaidapéNaRua. Siga sintonizado também todas às quartas-feiras, a partir das 18h, ao vivo, pela Central3 e pelo Facebook da Revista Vaidapé.

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Conexão Sudaca #176 América Armada

Tivemos um papo reto com Pedro Asbeg, parceiro de longa data e co-responsável pelo documentário América Armada, ao lado de Alice Lanari, cujo objetivo foi retratar três ativistas (e sobreviventes) contra a indústria da violência no nosso sub-continente.

Além da entrevista, repassamos a situação das copas nacionais na América do Sul e fizemos a prévia dos confrontos válidos por Libertadores e Sul-Americana na semana que vem.

Também relembramos o o jubileu de ouro do título mundial do Estudiantes de La Plata, celebrado na última segunda-feira (16/10), e os 20 anos do lançamento de Clandestino, primeiro álbum-solo do artista hispano-francês Manu Chao!

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Xadrez Verbal #162 Arábia Saudita

Matias Pinto e Filipe Figueiredo recebem novamente Marco Gomes, que comenta os tentáculos da Arábia Saudita em investimentos de tecnologia e bancos pelo globo. Será que você pegou emprestado uma grana saudita e não sabia?

Passamos pela América Latina, do México ao Chile, do Rio Grande à Terra do Fogo, com notícias sobre imigração, economia e direitos humanos. Voltamos ao Oriente Médio, para repercutir as últimas informações do caso Khashoggi e outras questões da região.

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NBA das Mina Extra – Praça Rotary

Neste episódio extra, decidimos contar para vocês a história da revitalização e reinauguração da quadra da Praça Rotary, na Vila Buarque no centro de SP.

Melhor do que nós, essas mulheres incríveis nos contaram como foi o processo de criação dessa quadra e também como esse projeto saiu do papel. com o apoio da Nike.

Conversamos com a Dea Nunes do Magic Minas, com a Bela Gregório da rede Efemmeras e ainda tivemos a oportunidade de conversar com a Damiris Dantas, atual jogadora na WNBA pelo Atlanta Dream, que muito emocionada foi ver de perto o esforço e determinação dessas meninas em conquistar um espaço bom para o basquete delas!

Nesta edição

Sabrina Araújo – @sabsdenada

 

Entrevistas

Dea Nunes – @magicminas

Bela Gregório – @belagregorio / @efemmeras

Damiris Dantas – @dantasdamiris

Para dúvidas, sugestões, críticas ou elogios (que amamos), vocês nos encontram também em nossas redes sociais ou pelo

nbadasmina@gmail.com.
Twitter: @podnbadasmina
Instagram: @nbadasminapod
Blog: nbadasmina.wordpress.com

Espero que vocês gostem! Divulguem, conheçam e conquistem espaços!

#BATTLEFORCESP #AFORÇAÉDASMINAS #THEFORCEISFEMALE

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Lado B do RJ #82 Pedro Asbeg

Os panelistas se reuniram nessa semana para falar com Pedro Asbeg sobre seu novo filme ” América Armada” e a evolução da violência causada pela guerra às drogas. O debate ainda se estendeu sobre a malfadada lei Rouanet e sobre as denúncias da Folha de São Paulo sobre a fraude eleitoral feita pela candidatura Bolsonaro.

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Botão #162 Racing de 1967

O Racing foi o primeiro argentino a se tornar campeão do mundo. El Equipo de Jose consagrou o apelido de Academia, e mostrou, em 66 e 67, um futebol ofensivo, vistoso, moderno, com zagueiros que sabiam tratar bem a bola e um ataque feroz. Um time que também sabia jogar duro quando necessário e ficou para a história pelas conquistas, mas também pela proposta. Timaço!

No programa de hoje, Leandro Iamin recebeu a visita de Mauro Cezar Pereira, dos canais ESPN, e Felipe Bigliazzi, El Biglia de La Gente. Tá no ar!

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Cine #118 – Um Dia Para Susana

Dando o pontapé inicial da abertura da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, entrevistamos Giovanna Giovanini e Rodrigo Boecker, diretores de Um Dia Para Susana, selecionado para a Mostra deste ano. O documentário conta a história de Susana, uma atleta com doença rara e com baixa expectativa de vida, que acomete partes do cérebro que regulam funções corporais e motoras. Susana decide retornar à natação com a meta de chegar aos Jogos Paralímpicos de 2016 no Rio de Janeiro, saga retratada pelos diretores.

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Trivela #193 Cruzeiro Campeão

O Cruzeiro ganhou de novo a Copa do Brasil, e este foi, claro, o tema central do podcast desta semana. Merecido? E o VAR? E a saga de Arrascaeta? Que gigante é o Dedé! E o Corinthians com uma formação inédita numa hora dessas? Falamos também de Brasil x Argentina, uma vergonha árabe, e um pouquinho de campeonato brasileiro. Vem com a gente!

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Bundesliga no Ar #40 França 2×1 Alemanha

A Alemanha perdeu para a França na Liga das Nações e se viu em uma insólita situação de “rebaixamento” da competição nova da UEFA. Este tema e o jogo é comentado aqui por Gerd Wenzel, que também falou da rodada 8 da Bundesliga, que chega no final de semana trazendo alguns duelos interessantes em uma tabela embolada e imprevisível.

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Desqualificadas #17 Sabe C*? Já dei

Sabe C*? Já dei

Clayton Heringer, cearense, produtor artístico da TocaLivros (empresa brasileira de audio livros), responde todas as nossas perguntas que nenhum homem hetero quis nos responder e também divide conosco a sua história: leitura, mudança pra São Paulo, machismo, sexualidade, privilégios, relacionamentos, força feminina…. Só vem.

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Livro:

Teoria King Kong – Virginie Despentes : https://bit.ly/2IFqlzi

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