Te pego num clique

É mais um dia comum na internet brasileira. Vocês está lá de bobeira em qualquer rede social passando os dedos na tela do seu celular ou descendo a barra de rolagem do desktop, e explodem na sua cara as coisas de sempre. Os memes do dia, um textão aqui, uma lacração ali, a velha arenga dos reaças-lunáticos-terraplanismo-arma-na-mao versus esquerda-vamos-abraçar-o-sol-vem-cá-fazer-ciranda.

Eis que de repente, não mais que de repente… pêi! Você caiu nela, a pegadinha do cliquebait. Pra quem não está a par do que se trata esse neologismo internético, vou dar a letra. É o caça-clique, o oportunismo, o me engana que eu gosto. Em resumo: apelação nua e crua. Eles, esses sociais medias malvadões, junto com os editores hypes, vivem de jogar casca de bananas na sua timeline. E você e eu, trouxas que somos, caímos iguais a água da goteira.

Para quem viveu os anos 1990, a analogia a ser feita é com o vale-tudo que rolava nas tardes de domingo na TV do Brasil, ou a Arábia Saudita de Biquini, como preferirem chamar. Naquele época a Rede Globo fazia coisas como colocar uma mulher deitada numa mesa coberta de peixe cru e arroz empapado (alguns teimam em chamar isso de sushi) enquanto atores e outros personagens do mundo irreal se serviam. Mudando de canal, a TV de Silvio Santos era especialista em closes genitais de bundas para cima, rebolando dentro d’água ao som de Companhia do Pagode e Karametade.

E tudo isso tinha um único motivo: a audiência. Quanto maior o número no Ibope, mais caro ficava o espaço publicitário e mais dinheiro as emissoras ganhavam. Passados duas décadas continua a guerra para que mais pessoas vejam algo e, com isso, as empresas de comunicação ganhem mais receita com publicidade. Vinte anos se passaram e há uma certa sofisticação no apelo.

As bizarrices não estão mais tanto no conteúdo, e sim nas chamadas. O mecanismo é o seguinte: Peguem palavras que gerem interesse do público e force a barra para que elas apareçam no título. Não importa se eles fazem sentido ou não. Quando o assunto for futebol, mesmo que for pra falar do campeonato do Azerbajão, tem que se encontrar um jeito de colocar a palavra Neymar no título. MAQUEIRO QUE TIROU NEYMAR DE CAMPO HOJE FAZ SUCESSO COMO SORVETEIRO EM DUQUE DE CAXIAS, é um exemplo

Continuando no futebol, também vale colocar os nomes dos times mais populares do país, mesmo se eles não tiverem em campo. Segue a imagem abaixo como exemplo.

Dentro do clickbait tem também aquilo que é conhecido como jornalismo José Punheta. Nesse caso os termos topless e sensual sempre aparecem. Nisso o internauta pimpão acredita que clicando naquele link reduzido encontrará a sub-celebridade mostrando tudo e mais um pouco, mas tem que se contentar com uma foto de umas costas desnudas ou um contra-luz que marca a sillhueta. E quando o assunto futebol e mulheres em poses sensuais se unem, meus amigos, é a pitomba do munguzá. Suco de feijão puro. Cuscuz fino.

Isso são só as chamadas, isso sem falar que o texto jornalístico millenium é amarrado que nem buchada de bode no tal do SEO. Repetir um certo de número de palavras-chaves dispostas de uma maneira quase imperceptível para que gere ranqueamento no Google e assim apareça primeiro nas buscas. Isso sem falar nas ferramentas de algorítimos atualmente utilizadas. E mesmo se o usuário clicou e passou menos de dez segundo na página, isso já conta como acesso para o pessoal do comercial. Cai em mim dindin.

Juro que passei horas aqui em frente do meu combalido computador guerreiro pensando em uma manchete apelativa para esse texto. Queria dar um daqueles título que terminam com ponto de exclamação. Depois de fritar os miolos o melhor que cheguei foi: JORNALISTA CRÍTICO DE NEYMAR AVALIA AS MANCHETES DA INTERNET MOSTRANDO ABDOMEM TRINCADO.

Acho que não levo jeito para essas coisas.

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Post impulsionado é o novo tempo de TV

A legislação eleitoral das campanhas no Brasil para as redes sociais é sempre um amontoado de regras confusas que mudam a cada eleição. Este ano mais mudanças estão causando incertezas e deixando brechas para abusos de todo tipo: de poder econômico por candidatos, partidos e coligações, até abuso de autoridade por juízes seletivos que manipulam a legislação de acordo com suas convicções particulares. Um exemplo é a legislação sobre posts patrocinados nas redes sociais. Proibidos nos períodos eleitorais anteriores, o patrocínio de postagens foi liberado este ano.

Com isso, as candidaturas mais ricas terão um poder de exposição publicitária infinitamente maior do que candidaturas com poucos recursos. Se antes era o bom conteúdo (bom não significa “do bem”) que engajava o público, agora com dinheiro qualquer lixo poderá ganhar bastante visibilidade. Prepare seu mural para uma superexposição de políticos este ano.

A distribuição de verba do fundo partidário acontece de acordo com o tamanho das bancadas federais. Os cinco maiores partidos do Congresso receberão metade de todos os recursos do fundo eleitoral: PMDB, PT, PSDB, PP e PSD receberão, sozinhos, um montante de R$ 838 milhões. Serão R$ 215 milhões para o PMDB, R$ 199 milhões para o PT e R$ 175 milhões para o PSDB. Partidos como o PV, PSOL e PCdoB ficarão com cerca de 1 % destes recursos.

Com a permissão de posts e anúncios pagos nas redes sociais, a distorção publicitária, que já enorme nas televisões e rádios, será imensa também na internet. Como alertou o pesquisador e analista de redes, Fábio Malini, o impulsionamento de posts será o novo tempo de tevê. O aparato do sistema eleitoral estará a serviço do poder econômico de partidos e candidaturas, consolidando um processo eleitoral extremamente capitalizado e com potencial manipulativo.

Deveria ser, mas não é a livre circulação de ideias o que garante o bom funcionamento da nossa democracia. É a grana, muita grana na mão do departamento financeiro, código eleitoral na mão do departamento jurídico e todos de mãos dadas com o departamento de marketing. É assim se produz os nossos processos eleitorais, e não é por acaso que o Caixa 2 e as mutretas financeiras toma conta das campanhas com muitos recursos.

As ferramentas de gerenciamento de posts e anúncios pagos, como o Power Editor do Facebook, possuem capacidade de refinar volumes imensos de dados para que as equipes de publicitários e especialistas em mídia direcionem anúncios para públicos específicos com precisão cirúrgica. E quanto mais dinheiro, claro, maior o alcance das postagens.

Semana passada o ministro do Tribunal Superior Eleitoral, Admar Gonzaga Neto, deu entrevista informando que, embora permitido, os patrocínios de postagens no período da pré-campanha podem configurar propaganda antecipada. Como tenho recebido na minha timeline diversos posts impulsionados, é de imaginar que possivelmente algumas multas vão acontecer aqui e ali.

Mas quem será multado?

Não acredito que o impulsionamento de posts deveria ser permitido. Ou melhor, se é pra ser permitido, que se permita a campanha explícita fora do período eleitoral propriamente dito. É uma forma de evitar o cinismo dos candidatos que fazem campanha antecipada fingindo que não estão fazendo. O que acontece com frequência, e ainda mais nas candidaturas com suporte jurídico milionário de advogados.

Temos um duplo problema: a propaganda paga na internet produzindo distorções do princípio de igualdade e abrindo margem para o abuso do poder econômico; e a falta de clareza das regras eleitorais tornando o quadro ainda mais nebuloso ao colocar mais poder na mão de juízes.

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Vale a pena a mobilização contra o machismo

*Por Fabi Maranhão

O domingo passado (9) começou pesado para mim. Pouco depois de acordar, me deparei com aquelas cenas assustadoras de intimidação e violência psicológica protagonizadas pelo agora ex-BBB Marcos, 37, contra Emilly, 20. Ainda ouços os gritos dele e vejo seu dedo em riste tocando o rosto da jovem encurralada na parede.

Instantes depois, lá estava eu compartilhando as imagens nos grupos de amigas no Whatsapp e comunidades feministas no Facebook, dos quais faço parte. Na mente, um pensamento: “Precisamos fazer barulho contra esse absurdo!”.

Ainda estava fresca na minha memória a bela e impressionante mobilização de mulheres famosas e anônimas, ocorrida na semana passada pelas redes sociais, que resultou no afastamento do ator José Mayer, 67, da próxima novela das 9 Rede Globo, para a qual ele estava escalado.

Em um depoimento chocante, publicado no blog #AgoraÉQueSãoElas, a figurinista da emissora Su Tonani, 28, acusou Mayer de assediá-la moral e sexualmente ao longo de oito longos meses.
http://agoraequesaoelas.blogfolha.uol.com.br/2017/03/31/jose-mayer-me-assediou/

A princípio, o ator se limitou a dizer “não misturem ficção com realidade” e colocou a “culpa” em seu personagem machista e misógino na novela “A Lei do Amor”. A Globo emitiu nota, na qual declarou que “repudia toda e qualquer forma de desrespeito, violência e preconceito”, que “todas as questões são apuradas com rigor” e que “não comenta assuntos internos”.

Tudo parecia caminhar para o conhecido “não dar em nada” quando um grupo de atrizes e funcionárias da emissora deu início a uma mobilização contra o ator e a violência sofrida pela figurinista. A tag #MexeuComUmaMexeuComTodas incendiou as redes sociais. Não demorou muito para que a Globo anunciasse o afastamento de Mayer, que logo em seguida divulgou outra nota, desta vez admitindo: “Errei no que fiz”. Foi mais que erro; foi crime!

Voltando ao domingo passado, lembro de ter ficado desanimada ao notar que poucas companheiras tinham expressado a mesma indignação que senti em relação ao que tinha acontecido dentro da casa do Grande Irmão.

Passei o dia postando no Twitter (já que quase não uso o Facebook), desejando ver nascer uma nova mobilização como a que havia sacudido o país na semana anterior. Demorou, mas o assunto, enfim, alcançou os TTs.

À noite, minha esperança e a de milhares de outras mulheres e homens era que, devido à repercussão do caso, a direção do BBB anunciasse a expulsão de Marcos. Para a nossa decepção, isso não aconteceu. Pior mesmo foi ver o público eliminar, por 77% dos votos, a participante Marinalva e manter o Marcos na casa.

Mas felizmente estamos em plena primavera feminista, que começou em meados de 2015 e não dá sinais de que pretende ir embora tão cedo. A pressão das redes sociais chegou até a polícia, que, no dia seguinte, foi bater na porta da tal casa mais vigiada do país. À noite, o apresentador do programa anunciou a expulsão de Marcos.

Em ambos os casos ficou evidente que a mobilização popular, principalmente das mulheres, foi decisiva para pressionar a emissora a tomar providências devidas. Infelizmente, não é sempre que gritamos e somos ouvidas, mas destas duas vezes triunfamos. E nossas gargantas já estão afiadas para as próximas batalhas.

 

*Fabi Maranhão é jornalista, vegetariana, feminista e militante dos Direitos Humanos.

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