Zona Sagrada

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Por Victor Faria

Era uma quarta-feira e todo o povo estava reunido para ver o jogo dos muchachos. As torcidas não se diferenciam somente por suas vestimentas, são alocadas previamente entre os seus, como se a pele de mesmo tom tomada por um ano fosse maior que a comunhão de povos.

O clima de festa em Atlanta é pela semifinal da Copa Oro. Um torneio cujo nome e objetivo são comercialmente fáceis de entender. Ali onde todos, crianças, homens e mulheres, levantavam às cinco da manhã para se vestirem ainda no escuro e saírem para trabalhar. Se apresentarem pontualmente ao estádio às seis da tarde e mais tarde retornarem às suas casas com fome. A alegria de um gol, de uma vitória, conquista. Tudo se justifica.

Alguns dirão que a vida não é tão ruim, mas quando a felicidade de um homem está selada a um time de futebol, esta se torna depressiva e repetitiva, como acontece com as coisas quando estancam e já não mais florescem a partir do que eram antes.

Lembrei dos jogos praticados na ilha. Os barcos retornando silenciosamente para não atrapalhar o andamento da partida. Os jovens jogadores, camareiros, pescadores, comerciantes. Todos em pés descalços atrás da bola que teimava em partir e retornar ao ritmo das ondas, ao desejo do mar. Praticavam com vigor, rapidez, uma força nervosa e habitual. O jogo era uma cerimônia sem enredo.

Logo ao amanhecer, nos dias de jogo, se reuniam para demarcar com estacas o terreno, zona sagrada. Bebiam café e observavam o campo. Um por um se ocupavam de desenhar em linhas imaginárias os sonhos semelhantes e tardios.

Em solo oficial um estranhamento sobre o andamento da partida. Ainda no primeiro tempo, um soar de apito e um expulso. Muita discussão. Era estranho ouvir um apito e não saber a origem de seu toque. Fio assim que soube que a revolução chegara aos campos. Durante o jogo os apitos repicavam em horas que ninguém podia identificar com vésperas ou matinas ou qualquer outra coisa: era como um novo tempo, um tempo que não sabíamos imaginar.

Um jogo sofrido, uma batalha arrastada em minutos finais de agonia. Mais uma interpretação equivocada, mas sem escrúpulos. A vergonha era nítida na marca do cal. Nos pés do batedor a sensação de profissionalismo e indiferença. Cabia ao arqueiro consolidar a justiça que nunca viria. O gol levara a partida para a prorrogação.

Pensei na regularidade do tempo, geração após geração aferrada às condições tradicionais, sem a necessidade de minutos adicionais. Fui criado dessa forma, decente, todos fomos. A decência em demasia e continuidade.

Nos primeiros minutos do tempo extra a decisão final. Aquele velho gringo, destinado a tomar as decisões mais cruciais daquele tempo, quisera ser o protagonista de tal história. Quis que suas decisões fossem maiores que a vontade dos Deuses, do futebol, do mar. Soou o apito novamente. Estipulada a condição de mais um gol para os rivais.

Aguardamos o final da partida sem qualquer sinal da esperança. Deve ser a vontade dos homens. No estádio todos saíam em silêncio, comovidos em vergonha alheia e sujeita a discussão. O resultado era um roubo. Eram as tais regras do futebol.

Ao sair do estádio, nada do jogo me importava senão a memória da ilha. Os passes sem contagem, os chutes sem destino. O desejo de jogar até que o entardecer se alinhasse e destinasse às escuras o apito final. Todos voltando pra casa sorrindo, jogadores e torcida, satisfeitos com a prática de um distante futebol.

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