Axl, Nós e Eles

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O Guns N´ Roses esteve no Brasil no mês passado, tocando no Rock in Rio. A banda veio com boa parte de sua formação clássica, e fez um show de quase quatro horas, em que passou por quase todo seu repertório de canções – muitas delas verdadeiros clássicos do rock. Aliás, o Guns deve ser o caso mais impressionante da relação entre “quantidade de álbuns lançados” versus “tamanho da banda” na história do rock. Se tirarmos “The Spaghetti Incident?” (um álbum de covers com boa parte das faixas gravadas durante as sessões de “Use Your Illusion”) e “Chinese Democracy” (praticamente um disco solo do Axl), e ainda se forçarmos a mão e considerarmos “Use Your Illusion” I e II como apenas um álbum duplo, temos uma das bandas mais populares da história do rock, e da música em geral, com apenas três discos lançados. Seus fãs são fervorosos, apaixonados, e certamente a presença da banda no Brasil fez centenas de milhares de pessoas felizes.

Mas esta coluna não é sobre o Guns N´Roses.

No dia seguinte ao show, pouco se falou do show. O grande assunto era Axl Rose. Vinte e cinco anos se passaram desde a última turnê da fase áurea do Guns. A voz de ninguém permanece a mesma depois de 25 anos. A minha mudou muito – ok, eu tinha apenas doze anos, minha voz devia ser ridícula. Apesar dessa verdade inescapável, só se falava na voz do Axl. Minto, se falava também na aparência do Axl. Sobre como ele envelheceu “mal”. Ora, ora, juízes de envelhecimento alheio, certamente muitos sem espelho. Novamente: alguém se mantém igual depois de 25 anos? Nem o Keith Richards, baby. Pouco se falou do esforço que ele ainda faz pra manter viva a chama da banda – sim, eu sei que ele é regiamente pago para isso. De seu carisma no palco – ou alguém imagina outra pessoa em seu lugar num show do Guns?. Ou do fato de ser ele o compositor de quase todas aquelas canções. Dito isso, saliento: óbvio que uma crítica ao show, formal ou informal, pode e deve passar pela performance do vocalista. A questão é como o assunto é tratado.

Mas esta coluna não é sobre fazer de Axl Rose uma vítima.

Não preciso dizer que dentro do escopo da população mundial, Axl Rose passa longe de ser um vítima. Mas isso não nos impede de debater a relação que temos com as pessoas famosas. Existe uma impessoalidade em nosso trato, de maneira geral. É como se não estivéssemos falando de pessoas, mas sim de tartarugas gigantes das Galápagos, que não serão atingidas por nossas falas/atos porque não são pessoas, afinal. E apenas pessoas sofrem com palavras, com opiniões de outros sobre si. Como eles são milionários, gozam de fama, tem tudo que o dinheiro pode comprar, não preciso ter respeito nenhum por eles. Continuando na metáfora da tartaruga, é como se eles tivessem uma casca que os protegesse de todo mal. “Foda-se se eu falar que a fulana botou tanto botox que tá parecendo uma múmia, ela é rica mesmo, nem vai ligar”. Suicídios de celebridades cheias de fama e fortuna mostram que não é bem assim – e não estou aqui relativizando a depressão, causa maior dessas mortes, apenas pontuando que artistas não são alienígenas imunes a tudo.

Mas esta coluna não é sobre suicídio de famosos.

Não foi o “caso Axl Rose” que me despertou para essa questão de como tratamos as celebridades. Foi o documentário Amy (excelente, e disponível na Netflix), que já vi há algum tempo, sobre a cantora Amy Winehouse. O filme mostra o que levou uma menina alegre, que aparece sempre sorrindo e feliz em vídeos caseiros antigos, a morrer aos 27 anos em decorrência do abuso de substâncias químicas. Após o sucesso monumental alcançado, Amy virou uma das maiores vidraças do mundo moderno. Era uma dependente de drogas e bulímica, duas condições patológicas que, por algum motivo, achamos aceitável serem alvos de tirações de sarro. E como tiramos sarro dela. No mundo inteiro ela foi alvo de piadas – seja na TV, na internet ou em conversas de amigos. Não faríamos o mesmo com alguém que tivesse hanseníase, por exemplo. O filme mostra um retrato assustador de uma mulher morrendo em praça pública para o nosso entretenimento. Nunca fui um grande fã de Amy, mas a parte final do documentário bateu em mim como se fosse um filme de terror. A diferença é que o assassino não era o mordomo. O assassino era eu mesmo.

E ao final acho que esta coluna é muito mais sobre nós do que sobre eles.

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