Como não fazer carreira na música

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Por Luiz Felipe de Carvalho

Em matérias sobre artistas do mundo da música, é comum encontrarmos diversas receitas de sucesso. É normal, por parte dos jornalistas, querer saber quais caminhos foram percorridos para se “chegar lá”, neste ambiente tão competitivo, e assim entregar uma fórmula do sucesso. Se a pessoa está sendo entrevistada para um veículo de comunicação, já é sinal de que ela tem o tal do “lugar de fala” para discorrer sobre o assunto. Mas quase nunca ouvimos o lado de quem fracassou miseravelmente. Por um motivo simples: as pessoas que fracassam não dão entrevistas. Mas em alguns casos, elas podem ter uma coluna em um veículo independente e falar um pouco sobre isso.

Lá no começo dos anos 2000, cheguei a tentar uma carreira na música, junto a mais dois amigos. O roteiro inicial seguiu os passos básicos: ambiente de faculdade, juventude, sonhos, formação de uma banda, etc. Mas porque, exatamente, não deu certo? Antes de mais nada, é importante estabelecer que “dar certo”, neste caso, significa conseguir viver de música. Também é importante saber que já se passaram mais de 15 anos de meu “fracasso”, o que nos tempos atuais equivale a alguns séculos. Para finalizar, parto de minha experiência, que é o que tenho – embora espere que ela tenha alguma ressonância na experiência humana de maneira geral.

Quase sempre parte-se de uma tríade para explicar o sucesso: talento, sorte e vontade. Talvez se possa acrescentar mais uma palavrinha, ou mudar ligeiramente alguma dessas, mas basicamente é isso. E entendo que não está muito longe da verdade. Boa parte dos artistas que conseguiram uma carreira bem sucedida tiveram uma boa mescla desses três ingredientes (ter um deles em demasia certamente ajuda a compensar a falta de algum outro). Então o que faltou para mim e meus amigos, especificamente? Vou tentar discorrer um pouco sobre os três itens, da maneira mais honesta possível.

Talento – Não é um conceito dos mais objetivos, especialmente quando se fala de si mesmo, mas vamos lá. Instrumentalmente, este que vos escreve era o mais medíocre do trio. Meu violão funcionava bem nas rodinhas, mas talvez não estivesse pronto pro sucesso. No entanto, nós três escrevíamos boas letras, e tínhamos boas canções próprias. E talento se burila com o tempo, não é sempre que um gênio se apresenta pronto logo de cara. Portanto, creio que a repetição fosse fazer de nós uma banda cada vez melhor. Dá-se o mesmo, por exemplo, com jogadores de futebol. O contato diário com a pelota pode fazer maravilhas por alguém que tenha dentro de si um talento mínimo que seja. Então acho que aqui estávamos bem. Não foi esse nosso problema.

Sorte – Claro que toda banda espera que, um dia, em um show para seis pessoas, uma delas será aquela que enxergará tudo que o resto do mundo ainda não viu, e levará a banda ao estrelato. Mas isso não acontece sempre. De maneira geral, a sorte pode se manifestar de várias outras maneiras. Por exemplo, no local que se escolhe para fazer sua primeira gravação. Nós éramos uma banda de percussão e violões, e escolhemos um estúdio especializado em rock para nossa primeira demo. O resultado não foi bom, para dizer o mínimo. Tínhamos a sorte de sermos estudantes de jornalismo, e de termos contato com rádios e jornais. Fizemos aparições em programas, mas de que adiantava, se a faixa a ser tocada no rádio tinha uma qualidade ruim? Gastamos tudo que tínhamos em um demo que, por um misto de falta de experiência nossa com dificuldades do produtor para o som que fazíamos, ficou uma merda. E esse azar pode ter nos custado o sucesso. Claro, isso unido ao fato de que a tal pessoa que, num show para meia dúzia, enxergaria nosso imenso talento, nunca apareceu.

Vontade – Não foi por acaso que este item ficou por último. Muitos artistas se deram bem porque tinham muito talento. Outros tantos porque tiveram muita sorte. Mas creio que a maioria atingiu o sucesso porque realmente queria. Com todas as suas forças. E abdicaram de todo o resto por isso. E aperfeiçoaram seu talento, e deram chance à sua sorte. Há um exemplo disso dentro dessa mesma banda da qual fiz parte. Dois de nós hoje fazem outras coisas da vida. Mas um prosseguiu tentando, e hoje faz parte de uma banda relevante no cenário alternativo (Dom Pescoço), depois de muito bater cabeça. Não é um sucesso retumbante, não estão estourados na Dinamarca, mas é aquilo que falei no começo do texto, de conseguir fazer da música seu modo de vida. De minha parte, confesso que nunca tive essa vontade que se apresenta quase como um chamado. Eu queria medianamente, e teria prosseguido se tivesse tido mais sorte ou mais talento. Mas fui até onde deu, até onde achei que deveria ir.

Concluo que meu fracasso na música tenha ocorrido, essencialmente, por falta de vontade. Nunca brigamos, e quando a banda acabou, foi basicamente porque faltou vontade de prosseguir. Um pouco de saco cheio. De preguiça. Algum tempo depois do fim, foi aventada a possibilidade de voltarmos a tentar, e fui o menos empolgado com a ideia. Para mim, já tinha sido. Eu já me lembrava daquilo como algo que havia ficado no passado, como uma lembrança bem bonita: “Eu tive uma banda, eu fiz shows, eu toquei em barzinhos, eu gravei um disco. Isso me basta”.

Se isso fosse um texto de auto-ajuda, eu finalizaria dizendo que, para ter sucesso, é preciso que você queira muito, que não consiga imaginar sua vida sem aquilo. Esse não é um texto de auto-ajuda. Mas, agora, já está dito.

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